Por Clarice Lispector

Gosto dos venenos mais lentos!
Das bebidas mais fortes!
Das drogas mais poderosas!
Das idéias mais insanas
Dos pensamentos mais complexos
Dos sentimentos mais fortes.
Dos cafés mais amargos!
Tenho um apetite voraz.
E os delírios mais loucos.
Você pode até me empurrar
de um penhasco que eu vou dizer:
E daí?
Eu adoro voar!"

domingo, 9 de maio de 2010

ÀS PORTAS DOS DEZOITO

Às portas dos dezoito
Não podes mais ser quem eras outrora;
Deves ser algo novo,
Teoricamente dotado de maturação prévia.

Às portas dos dezoito
Os hábitos infantis necessitam ser refutados;
Nem tudo o que vem a cabeça
Deve ser expressado;
Tuas alegações (absurdas ou não)
Não são mais relevadas.

Às portas dos dezoito
Asas estão sendo criadas,
Para tão logo alçarem vôo à liberdade, a independência,
Que nem sempre se concretizam,
Mas de forma ou outra estão sendo construídas.

Às portas dos dezoitos
Não cabem mais as indecisões,
O mundo chama-te,
Exige de ti uma resposta,
Uma postura o menos ambígua possível,
Mesmo que seja justamente este o momento
Em que todas as dúvidas resolvem aflorar.

Não és mais uma menina.
Mais que isso,
Não podes ser mais uma menina.
Tudo a teu redor clama
Para que te transformes em mulher.

Então te desespera por
Ter de ser mulher e não sabê-lo,
Por ser impossível deixar a menina.

UM DIA SEM ELA

Houve dias
Que dormi sem te-la,
Acordei contemplando sua ausência
Na esperança de que voltasse.

Houve, também, outros dias,
Em que nada esperei,
Rompendo em lágrimas
Por deparar-me com algo inevitável demais
Para não me dilacerar.

Aparentemente estes dias se foram,
Voaram para o infinito,
Onde todos os dias tornam-se
Apenas recordações.

Que ingênuo engano!
Aqueles dias se foram,
Mas outros nascem continuamente.
Transpõem-se os anos,
Continuando por anos a fio
O interminável fuso da melancolia.

Os dias sem ela nunca serão findos.
Até a eternidade há, ainda, muitos dias a transpor,
E enquanto esta não chega,
Cabe-me contentar
Com o vazio dos meus dias.