Por Clarice Lispector

Gosto dos venenos mais lentos!
Das bebidas mais fortes!
Das drogas mais poderosas!
Das idéias mais insanas
Dos pensamentos mais complexos
Dos sentimentos mais fortes.
Dos cafés mais amargos!
Tenho um apetite voraz.
E os delírios mais loucos.
Você pode até me empurrar
de um penhasco que eu vou dizer:
E daí?
Eu adoro voar!"

domingo, 8 de maio de 2011

Quem quer viver para sempre

Quem quer viver para sempre?

Ao ouvir Who wants to live forever, qual o indivíduo que não pondera o ato de viver para sempre? Alguns não possuirão a sensibilidade para tanto, no entanto, a eternidade é uma proposta tentadora, mas até quando?Cabe ressaltar, que é ridícula a perspectiva de eternidade retratada por alguns Best Sellers fajutos da literatura juvenil. A eternidade aqui retratada vai além, bem mais além.
A eternidade apresenta-se tentadora, quando livre das implicações religiosas, nas quais é necessário morrer, a fim de conquistar a eternidade em um corpo glorioso, e por aí vai. Todavia, a perspectiva de morrer para obter a eternidade, limita muito o conceito de eterno. Eterno remete a contínuo, algo que jamais será findo. A morte implica em uma pausa na trilha da eternidade, como se fosse um jogo de vídeo game, no qual há de se passar de fase. Isto promove uma cisão na linearidade da eternidade.
Entre os prós de viver para sempre reside, justamente, a ideia de não morrer, desfrutar ao máximo das situações que a vida apresenta. Observar as transformações que o mundo e a tecnologia promovem, a fim de que ocorra a evolução. Adquirir conhecimento advindo de diversas épocas, possibilitando a expansão dos horizontes intelectuais, eliminando erros banais a caminho da perfeição.
Há a possibilidade de congregar a eliminação dos erros a teoria do Eterno Retorno, de Nietzsche. O indivíduo retornaria a determinadas situações por vezes eternas. Contudo, seria impedido de proceder de maneira diferente em tais situações. Os erros seriam percebidos, porém não poderiam ser sanados. Qual seria, então, a lucratividade do Eterno Retorno?
O homem está, e sempre foi mal acostumado. Possui uma necessidade doentia de obter lucro de toda e qualquer situação. Não obstante, há situações que não apresentam lucro prático, o que, também, não as desvaloriza. A riqueza do Eterno Retorno não é prática. Há o engrandecimento do homem, através de sua razão, uma vez que limitação humana é algo que deve ser superada.
Infelizmente, pode-se dizer que a eternidade é triste, ainda mais quando acompanhada da solidão, com visto no filme Highlander. Com a eternidade, as possibilidades do novo, da capacidade de se surpreender são reduzidas. Tudo já foi visto, apesar do acompanhamento das transformações do mundo. O encanto pela vida vai sendo soterrado pelo tédio e pela monotonia.
Quando se é o único, ou um dos poucos imortais, como o Highlander, é tamanha a dor ao perceber que seu ente querido envelhece e morre, e o indivíduo nem ao menos tem a esperança de encontrá-lo na eternidade, uma vez que a eternidade se faz no presente e em momentos futuros, de maneira contínua.
Se viver é repelir compulsivamente aquilo que deseja morrer, o imortal apresente grande êxito. Contudo, pode-se alegar que o eterno é desprovido do desejo de morte? O que se pode dizer é que não há a preocupação com o fim, uma vez que este não existe.
Muitos afirmam que a vida, a história são cíclicas. Realmente o são? As situações não se repetem como no Eterno Retorno, entretanto, seguem um padrão, este sim é cíclico. A sucessão cíclica dos eventos, ainda mais a nível eterno, converge em um caráter de rotina destes, impingindo o tédio.
Uma vez que a vida decorre de acordo com um padrão cíclico, a eternidade é despojada da nostalgia do passado. A nostalgia advém do desejo de reviver o que não é possível de ser revivido. A eternidade não atua a fim de sanar a nostalgia, embora a amenize, já que o padrão do objeto nostálgico tenderá, certamente, a se repetir.
Antes a eternidade humana, àquela das religiões. A última apenas existe em função do medo da morte, que existe inata e involuntariamente no homem. O homem teme a morte em função de não saber se sua existência persistirá após esta. Deste medo nascem as crenças na eternidade religiosa, como um alento. Não obstante, tal eternidade jamais foi provada, visto que a comunicação entre o mortal terreno e o imortal pós morte nunca foi possível.
Quem quer viver para sempre? Eis uma pergunta de dificílima resposta. Definitivamente findaria o medo da morte, mas também a capacidade de se surpreender. A eternidade não pode ser para sempre, já que o para sempre, sempre acaba. Pode parecer redundante, no entanto, se os infinitos possuem tamanho diferente, a eternidade também se faz finda.

De um ouro negro inesquecível

De um ouro negro inesquecível.


A vida é cíclica. É uma montanha russa em alta velocidade, na qual fracassos e vitórias se transpõem. Esta é a parte fácil. Difícil é ter a percepção de o que foi vitória outrora se tornou fracasso.
Fazia anos que não retornava aquela maravilhosa cidade. A última vez que esteve lá era uma jovem as vésperas de seus 18 anos. Repleta de sonhos, planos e romantismo. Tinha tudo para ser uma das melhores viagens de sua vida. Tinha os amigos e algo mais. Lutara para estar ali. Não importava se não havia sido tão perfeita para seus amigos, para ela fora incrível.
A cidade não mudara muito, a não ser a conservação dos prédios históricos. Ela mudara demais. Talvez o que não mudasse nunca era o caráter ofegante das ladeiras. Resolvera tirar umas férias das preocupações. Amava o que fazia. Batalhara demais para conseguir realizar um de seus maiores sonhos. Isto quase a exauriu. Ainda não possuía notoriedade no meio, porém exercia o que seus princípios sempre indicaram. Tratava mais que mentes doentes. Tratava seres biopsicossociais.
Talvez não tivesse mudado tanto assim. Ainda gostava dos clássicos da literatura, da filosofia. A descarga de Dopamina ainda acontecia ao som das prediletas canções de heavy metal. Sua paixão ainda era compor. Contudo, crescera desde a última vez que estivera ali.
Muitos acham solitário ou monótono viajar sozinho. Era necessário o silêncio de outra terra, na qual ninguém lhe conhece. Poderia até parecer perigoso andar a esmo por ruas desconhecidas, mas ela andava guiada por um impulso interior. Naturalmente as lembranças daquele lugar fluíam e deliciavam-na.
Uma das lembranças a deixava um tanto triste. Todavia, havia aprendido a conceder aos que ama a liberdade de abandonarem-na. Isto não a tornava a pessoa mais feliz, mas a com a consciência mais leve. O que emanava daquele lugar era a possibilidade do que não foi. O amor que seria lindo, caso não fosse doentio. Não que tivesse abandonado o romantismo, no entanto, aprendera que apenas amores incompreensíveis e incompletos podem ser românticos. Estes jamais serão esquecidos.
O frio da noite de inverno era tão aconchegante. Andar na rua, no frio era tão revigorante, mesmo mediante a solidão, mera figurante. O museu estava todo iluminado. Os cafés com indivíduos tomando sua bebida, seu chocolate, seu chopp de menta. Comprara uma garrafa pequena de cachaça, não para o momento, mas para degustar no quarto, no calor das cobertas.
Entrara em um restaurante meio rústico, meio caro. Fazer o quê, é uma cidade turística. Pedira um caldo, um vinho, um suco. Não nesta ordem. O vinho esquentava-a, o caldo alimentava-a e o suco adocicava-a. Um violeiro tocava musica popular, embalando os presentes, causando nostalgia. Ela sentia vontade de dançar agarradinho. Este era o problema de viajar sozinho. Então, balança-se sentada, curtindo a beleza da canção.
Um sujeito magro, muito alto e moreno se aproxima e a convida para dançar. Por segundos, passa pela cabeça dela a insanidade de dançar com um desconhecido, ao mesmo tempo do questionamento acerca da perda da ousadia de outrora. Deixa-se levar na dança. Os dois saem do restaurante, vão conversar na praça em frente, sob o olhar do luar e do frio invernal.
O sujeito era pintor, mas trabalhava com fotografia no ramo de audiovisual. Era um idealista. Um livre pensador que buscava a alegria. Não possuía preconceitos. Tamanha era sua afetividade, tão carinhoso, mesmo com uma desconhecida. Uma sociedade como a nossa, que deixou há muito de sonhar, desacreditam os idealistas. Isto a deixava tão frustrada, mas o encontro com este sujeito possuía uma pontada de esperança.
Nunca fora fã da esperança. Acreditava que era vã e iludia o homem em buscas inúteis. O sujeito lhe falava de esperança, de pensamento positivo, otimismo. Na atualidade, isto havia se tornado até clichê, mas ele falava com pureza, como sua avó em tempos passados. Ela crescera com estes ideais. Era decepcionante ver seus amigos matarem tais ideais, mas ela nunca os deixou morrer.
Certamente possuiria um acompanhante para a cachaça. O sujeito a acompanhou até seu quarto no hotel. Ela ficou apreensiva com isto, mas uma deliciosa descarga de adrenalina fluía em suas veias, fazendo-a recordar de momentos insanos da juventude. Outra coisa que também a frustrava era a falta de confiança da humanidade. Os indivíduos não confiavam plenamente. Até amar estava difícil, uma vez que o amor pede doação, troca e confiança, e os indivíduos, nem sempre, estão interessados. O estresse do dia a dia possibilita que as pessoas fiquem ensimesmadas. Isso foi o que lhe veio à cabeça ao acordar na manhã seguinte com o sujeito a seu lado.
Possuíra uma criação conservadora, que prezava a mulher difícil, que punha os homens a seus pés; que prezava a virgindade. Ela nunca concordara com isso. Parecia tão medieval. A mulher é livre para fazer o que bem entende, desde que se respeite e tenha amor próprio. Fora oprimida com isso, mas hoje possuía o que precisava para não importar-se com tanto.
O sujeito fora embora com seu telefone. Ela ansiava que ele fosse como qualquer outro homem e não ligasse. Ele não era qualquer homem, havia ligado.
Ela ficara surpresa. Contudo, ele não era homem para ela. Ele era livre demais. Ela queria liberdade.
Há os que falem do amor vazio de uma noite. Qual o mal disto? Há indivíduos que não desejam um “para sempre”, mas fazem de um “agora” seu “para sempre”. Ela seguiu sua viajem a esmo pela cidade predileta, degustando de cada momento eterno de prazer. Percebendo que o sujeito não era desconhecido, e sim reincidente, mas a vida é cíclica e não se percebe que um aparente fracasso é a vitória nascente.

Memórias não póstumas

Memórias não póstumas

Há homens que nascem póstumos. Eis uma forte afirmação. Seus princípios são cravados em pedra, quase. Deveras, há homens que nascem, mas não para este mundo. Para um próximo talvez. Há homens que nascem para morrer; outros que morrem durante toda a vida, sem a percepção disto.
A obra literária machadiana é incrível. Joaquim Maria Machado de Assis foi um estupendo escritor, crítico literário e principalmente analista do contexto social de sua época. Eu não gosto dele. Na verdade, o que acontece é um misto de amor e ódio. Um amor como o dedicado a Capitu, a Simão Bacamarte. O ódio não é justificado. O que virá não é nenhuma espécie de plágio, muito mais uma paródia, inspirada na postumidade das memórias do não tão saudoso Brás Cubas.
Quando a morte chegar, que não seja abrupta. Venha de mansinho, com o badalar de sinos, ou qualquer coisa de caráter ressoante, a fim de que se faça percebida. Infelizmente, a morte não faz escândalo, muito menos avisa quando está para chegar. O que é desejado é o relato de uma vida toda, com a limitação de uma não totalidade. Um relato a fim de que as próximas gerações tomem consciência de alguém que viveu, amou, sofreu (não pouco) e morreu amando e na esperança do amor eterno.
É esperado que seja mais que uma mera sequência de recordações de remotos momentos. Momentos são fugazes. São como o pássaro, o inseto voador (se assim preferir) que em segundos voam para longe, mediante quaisquer movimentos. Por mais ternas que sejam as lembranças, um dia elas são esquecidas, ou tornam-se mentira, uma vez que passaram para sempre, e sua realidade não pode mais ser provada.
As ideias de um homem, contudo, jamais morrem ou são apagadas. Embora sua materialidade seja pouco palpável, são internalizadas por outros homens, ou por obras. Que as memórias sejam, não de momentos, mas das ideias que consumiram uma vida. Por uma ideia mundos e fundos podem ser movidos; homens podem ser mortos. A defesa de uma convicção pode findar amores, amizades, promover a solidão, a incompreensão.
Nenhuma espécie de traição é justificável, muito menos louvável. Todavia a traição perante a própria consciência, as próprias convicções é um crime inafiançável, um pecado mortal. As convicções estão para além das certezas. Não são inatas. São construídas com tempo, suor e sangue. Há indivíduos que morrem, sem jamais possuírem a convicção de coisa alguma. Estas devem ser perduradas e transmitidas em um futuro.
Certamente, haverá sujeitos que farão alarde e se sentirão injustiçados com determinadas convicções. Mas o que haverá de ser feito? Ninguém, nenhum ilustre pensador jamais afirmou que convicções são, necessariamente, verdades. Verdades, todavia, podem ser construídas por convicções. Para esta teoria há pensador que justifique. Ainda mais quando se concebe que as verdades são relativas, questões de referencial.
Há indivíduos que consomem toda a vida na incessante busca pela execução do bem. Uma tarefa de tamanha e singular honraria. O decepcionante reside na percepção das motivações mais intrínsecas de tal execução. Não se executa o bem de maneira desinteressada, simplesmente pelo bem comum. Há interesses diversos em jogo, como a conquista da salvação mediante a caridade, ao amor ao próximo, que deveria ser algo gratuito e natural. Não obstante, o pior ainda está por ser desvendado. Pode, inclusive, ser encarado como nefasto. O bem é executado com o intuito de impor a supremacia do poder próprio sobre o outro. Sua continuidade é a manutenção do vinculo de dependência gerado desta imposição, fortalecendo o outro, fazendo com que este acredite que foi o poder alheio que promoveu seu fortalecimento. Isso soa tão desprezivelmente. Infelizmente, uma reflexão apurada pode demonstrar que isso é fato.
Outra coisa óbvia e não declarada é a possessividade intrínseca ao amor. Isto está além de qualquer análise filosófica. Com o decorrer do tempo, e principalmente com o fim de uma relação amorosa é perceptível que o fator promotor do amor era a posse. O amor só possui sentido, só é substancializado com a posse do ser amado. Fora isso, é um amor platônico, etéreo. No entanto, o mais dilacerante ainda está por vir. A beleza do amor reside, justamente, no próprio ato de amar, muito mais que no ente amado. O sujeito ama mais seu amor pelo ser amado, do que este propriamente dito. Pode parecer sem sentido ou surreal, mas basta considerar que a maior parte do sentimento amor advém de uma imagem idealizada da pessoa amada, e não da imagem real desta.
Nenhuma destas convicções foram construídas sem o componente dor. Esta foi a única constante em meio a imensas confusões e reviravoltas. O entendimento, muitas vezes, era quase instantâneo de tão óbvio. Contudo, a aceitação era mais difícil, duríssima. Era, e ainda é, para qualquer indivíduo, complicadíssimo aceitar algo que rompe com o que, então, era aceito como verdade absoluta. Com a aceitação nasce, deveras, a ciência da inexistência de verdades absolutas.
A morte das verdades absolutas, para alguns causa também a morte de Deus pelas mãos destes. Todavia, Deus não precisa morrer, uma vez que o que ele pede é, apenas, a sua fé. Há quem se retorça ao ouvir esta sentença. Todavia, a fé é nada mais que acreditar, é a convicção de que tal coisa existe, uma vez que não existem provas materiais para comprovar sua não existência, bem como sua existência. Acreditar em Deus é questão de fé, já nas histórias da carochinha que as Igrejas contam, é burrice. O que faz das Igrejas medíocres é o fato de reles homens desejarem a sobrenaturalidade, e quem sabe se igualar a Deus, mas isto eles nunca admitiriam.
Com a leitura deste relato há os que pensarão que esse Brás Cubas parodiado é um sujeito taciturno, casmurro ou infeliz. Pode ser que estejam certos. No entanto, estão sendo superficiais. Uma criatura que reflete demais o que acontece ao seu redor, e que, inúmeras vezes, sucumbe aos seus pensamentos e devaneios, jamais seria, necessariamente infeliz. A felicidade é filha, irmã gêmea do desejo. Embora convicções deste taciturno, possam até se configurarem como pessimistas, descaradas ou deprimentes, não impedem que ele seja um homem-máquina-desejante.
Esse Brás Cubas dignificado não é um homem póstumo, nunca o será. Podem inferir sobre ele quaisquer juízos de valor, com exceção de afirmar que morreu por toda vida e que não a viveu de modo intenso e desesperado. Caso dissessem, desmentiriam Camilo Castelo Branco ao dizer que ele “amou, perdeu-se e morreu amando.”.

domingo, 10 de abril de 2011

Resenha de Persuasão

Persuasão é a última obra escrita pela autora inglesa Jane Austen, datado de 1818, publicado após a morte de Jane.
As histórias de Jane Austen seguem uma mesma estrutura, no qual se destacam o caráter romântico da descrição das personagens; a descrição de paisagens, principalmente, do interior da Inglaterra; e a austera, porém delicada crítica aos costumes, e principalmente, os preconceitos da sociedade inglesa do início do século XIX.
A princípio não compreendi bem porquê o título era Persuasão. Todavia ao desenrolar da história, o que demora um pouco, já que Jane além de prolixa é minimalista em suas descrições, percebe-se que o cerne da obra reside sobre o poder de persuasão que certas pessoas exercem na vida alheia.
É a história de Anne Elliot, a filha rejeitada de um falido barão, que, quando jovem, foi desposada por um rapaz, Frederick Wentworth, recém ingressado na Marinha britânica. Devido a condição de sua familia que beirava a falência, seu pai, sua irmã mais velha e Lady Russell, fiel amiga da familia, persuadem-na a rejeitar o pedido de casamento de Wentworth. Este não recebeu uma devida justificativa a cerca do término do noivado, partindo e se entregando ao trabalho, a fim de esquecer a amada.
Passados oito anos, Anne envelhecendo e rejeitando outros pretendentes, há o reencontro dela e de Wentworth, que a priori se apresenta frio e distante, o que promove efusões de confusões na mente de Anne, sem esta estravazá-las, entregando-se ás convenções sociais e em se mostrar agradável e útil.
Após idas e vindas Anne e Wentworth se encontram frente a frente, e este menciona que tentou ao máximo esquece-la, mas que foi impossível.E os dois se entregam ao amor.
Jane critica ferozmente com a historia de Anne e Wentworth, o poder de influencia da familia sobre um jovem, no seculo XIX,impedindo-o de ser feliz. Há também a crítica, principalmente sob a figura do pai de Anne e de sua irmã mais velha Elizabeth, ao desprezo dos nobres, mesmo que falidos, às pessoas mais simples, valorizando sempre as mais ricas e de maior influencia social.

Conto

O tempo já se fazia tempo antes mesmo de eu existir. Sempre foi soberano e altivo. Depois de tanto tempo, é que percebo isso. Não há como modificar. O que passou já se foi. O que virá dirá.
Muitas vezes o cansaço abate uma alma vívida. Muito mais o tédio e a rotina, do que o cansaço. O novo quase passa despercebido, mediante a imensidão do mar da saudade. Saudade de outrora, dos tempos áureos, dos anos cheios. Saudade de um amanhã, que ainda nem se fez presente, mas carrega consigo a esperança da superação dos anos vazios.
Fuga da realidade. Esta é a expressão. Devo sofrer de uma síndrome, talvez uma síncope romântica, maníaco-depressiva estilo Alvarez de Azevedo. Ninguém percebe isso, apenas eu, e quem sabe as corujas também. O motorista segue seu caminho, enquanto meu coração vai molemente dentro do taxi, entorpecido pelos pensamentos.
Não me considero uma pessoa fracassada. Pelo contrário, sou vitoriosa até demais. A questão está nesta inquietação, que parece existir apenas em mim. Devo estar absolutamente enganada. Isso é demasiado humano. Schopenhauer já dizia, é o jugo do homem. Desejo demais. Desejo a todo tempo, sem ter tempo de satisfazer meus desejos.
Poderiam, simplesmente, me dizer que a falta de tempo para a realização dos desejos é algo comum. Até poderia concordar, mas não consigo ser tão simplista. Nasci na época errada. Sou ultrarromantica. As emoções me consomem, para depois eu questioná-las mergulhada em um mar de saudade.
Quando era criança, e até quando não, possuía medo do escuro. A escuridão sempre me fascinou. O fascinante também provoca o medo. Seu poder de descortinar a hipocrisia, que a luz do dia encobre, é fascinante. Por isso, quando chego a casa observo tudo no escuro, ainda mais quando a luz da lua inunda o ambiente. A lua brilhava nos talheres engordurados da cozinha. Pode parecer estranho, mas me vi naqueles talheres. Mesmo maculada pelas intempéries do tempo, ainda tenho a capacidade de brilhar.
O telefone, com a musica predileta, livra-me de meus devaneios ultrarromânticos. Uma espécie de mau presságio encosta-se. Esta é uma sensação conhecida. Há tempos, quando o táxi partia com o amor, para jamais retornar, essa sensação se fez presente. Fico ouvindo a música avaliando se devo ou não atender ao telefone. Ao atender, uma voz dantes amada pronuncia as palavras derradeiras: é o fim.
É o fim. Estas três palavras, há meses, haviam sido pronunciadas. Não me recordo quem as pronunciou, mas era definitivamente o fim. Talvez nem tenham sido ditas com palavras. É bem provável que tenham sido ações, até intenções. Entretanto, o fim dito pela voz ao telefone soava de maneira bem distinta.
Infinitos são os segundos desde que ouço a pronuncia dessas palavras, até o momento que me atrevo a perguntar a que se refere este fim. Durante esses infindáveis segundos transcorre uma efusão de imagens mentais, especulando se é plausível ir ao encontro da voz. Antes de obter a resposta a chamada cai. Bem, não queria me desesperar, mas já estava na hora.
Uma vez li um livro, cuja história era a de um astro do rock em decadência, que comprava um paletó e ganhava um fantasma. O homem não precisa de mais um fantasma, visto que durante toda vida cultiva inúmeros fantasmas. O dono da voz ao telefone, apesar de ter ido embora da minha vida, deixou-me seu fantasma. Durante muitas noites aparecia na mansão das minhas lembranças. No entanto, o pior residia na presença de seu perfume. O mais dilacerante é o perfume que permanece após o ser amado ter partido.
“Amores serão sempre amáveis...”. O amor nunca se finda de verdade. Tentamos matá-lo com o tempo, contudo, ele permanece guardado em algum lugar de nosso obscuro córtex cerebral. Provavelmente, foi isso que me levou até a casa do dono da voz ao telefone, na busca pelo significado do fim. Enquanto subo as escadas percebo que meus pés pisam em algo molhado. Sutil, fluía o sangue pela escada. Pronto! Ele se matou, ou matou alguém.
Há certas coisas na vida que nunca se modificam. Outrora, foram tantas as vezes que salvei a vida dele de seu pior inimigo: ele mesmo. Posso acusá-lo de diversas coisas. No entanto, ele também me salvou de mim incontáveis vezes, e isso é inegável. Eu temia que, agora, tivesse chegado tarde demais.
Sempre gostei muito de filmes e séries de investigação. Todavia, não teria coragem de sair investigando por aí. Teria medo de encontrar o que tento esconder, tento não aceitar. Nesta hesitação chego ao ápice da escada e vejo o corpo estendido.
Nunca fui a um enterro. Isso não significa medo da morte, nem de cemitérios, já que fui á várias exumações. É a preferência de resguardar a lembrança de quando o sopro da vida habitava aquele corpo. Quanto aos ossos, são apenas ossos.
Sem pensar, imediatamente, ligo para o SAMU. Serviço não muito rápido, mas o tempo parece voar. Não sei dizer quanto tempo fiquei estática, observando o imenso corte na zona occiptal da cabeça o sangue que continuava fluindo. Queria tocar. Verificar se havia, ainda, vida naquele corpo que jazia na escada, mas estava estática.
Será que passava um filme pela mente dele, enquanto estava naquele estado de inconsciência? Na minha certamente passava. Era impossível represar as lágrimas. Estas já possuíam vontade própria. Todos os momentos lindos, e até mesmo os dolorosos iam e vinham. Como a vida é banal. Tão rápida e facilmente usurpada. Há minutos ouvia aquela voz, que poderá ser calada para sempre.
O mundo está sofrendo uma crise de amor. Filhos matam pais. Pais violentam filhos. Loucos matam sem a menor consciência, que acabaram com uma vida. Pode parecer redundância, mas quando se morre, morre-se para toda a vida. Não há mais aspirações, desejos, sentimentos. Simplesmente acaba. A morte vai chegar de forma ou outra, mas parece que certas pessoas não amam a vida. É a única maneira de explicar como alguns indivíduos matam sem o menor pudor.
Ouço alguém me chamar. Não chamam meu nome, mas sei que me chamam. Olho para as pessoas que estão dentro da ambulância, e todas estão caladas. Os paramédicos avaliam o corpo do dono da voz, e este agora perdendo a voz para a eternidade. É crendice popular dizer que é a morte que chama, quando seu nome é chamado e não se identifica ninguém lhe chamando.
Sinto-me balançada por algo, que não é o balanço da ambulância que segue em direção ao hospital. É como se uma mão invisível me balançasse. O balanço se faz mais intenso. Parece que tudo está rodando.
Sobressaltada, desperto com o motorista do táxi me balançando, quase gritando, pois devia achar que estava desmaiada. Enquanto isso meu telefone toca com a música favorita, e atordoada pago ao taxista a corrida. Desço do táxi correndo para não me molhar, atendendo ao telefone, suspirando aliviada por não ser deveras o fim.

domingo, 3 de abril de 2011

Para a eterna Ice Queen

Há sujeitos que passam pelo palco da vida como uma brisa fria, que estremece a espinha mas é, rapidamente, esquecida com o calor do aconchego de quem se ama.Há ainda outros tantos sujeitos que passam como um furacão, não em termos de destruição, mas em termos de intensidade e abrasão.
Uma amizade pode ser um furacão ou uma brisa fria. Pode também ser um ferro em brasa, do tipo dos que marcam o gado para toda vida, ou um ferro de passar que promove leve queimadura.
O acaso não é muito crível, mas são inegáveis as sublimes e sutis transformações que ele promove. A brisa fria pode se tornar um furacão com as propícias condições atmosféricas. Uma queimadura a ferro de passar, se bem feita, pode deixar marcas por toda a vida.
Mas o que seria por toda a vida? A vida é efêmera como um suspiro e longa como uma interminável cãibra. A eternidade pode ser um instante. A brisa fria ou o furacão podem passar, mas dificilmente a sensação que eles causaram será completamente esquecida.
O carinho, o abraço, as palavras de afeto e apoio, os mais belos e também os mais tristes olhares de um amigo sobrevivem nos lugares em que muitas coisas como dinheiro, poder e vaidade não sobrevivem.
Pode ser que os amigos se separem. Nada mais natural. Faz parte do curso normal da vida. Os indivíduos na busca por si próprios deixam família e amigos, que dificilmente serão esquecidos, mesmo sem a constância da presença.
É até clichê dizer que no futuro os filhos destes indivíduos olharão para o baú de recordações de seus pais, e verão as lembranças daquele bando de sujeitos loucos. Aqueles sujeitos loucos eram, e porque não ainda são, os maiores amigos que um indivíduo pode ter. Estes sujeitos loucos gozando de sua liberdade foram fundamentais para o indivíduo de hoje.

quinta-feira, 31 de março de 2011

O perfume do amor

O adeus advindo da porta que se fecha,
Com o amor que se vai;
O fim que mata as perspectivas de felicidade,
Não é o que verdadeiramente causa a dor.

Nos primeiros momentos após a partida,
Há a solidão cruciante,
Que é a única companhia.

As lembranças fazem-se constantes,
Difíceis de serem apagadas.
O ponto final tão desejado
Está bem longe da realidade.

Tudo isso ainda é tão pouco...
O mais doloroso, deveras, é
O perfume que ficou
Depois que o amor se foi.

Felicidade Clandestina

Há quem diga que o homem é composto de duas forças indissociáveis, porém opostas, a razão e a emoção. No entanto, pode-se ir além. Homens – máquinas – desejantes seria mais apropriado. Atire a primeira pedra quem nunca desejou e se debruçou sobre este desejo na busca pela felicidade.
Um filósofo do século XIX disse um dia, que o homem entrega sua vida a saciação de desejos. Tal saciação está envolvida em um intrincado ciclo vicioso, no qual a felicidade é sinônima de saciação. Tal saciação acontece de maneira tão fugaz, que o saldo de toda a empreitada desejante é o vazio.
Homem – máquina – desejante é a expressão da busca pela felicidade. Vai se apresentar como o esforço contínuo do homem em desejar, buscar a satisfação deste desejo, satisfazer tal desejo, obtendo, portanto, a felicidade e retornar a desejar para que o vazio não se faça perceptível. Exatamente uma máquina a produzir desejos em série.
Com isto cabe a reflexão acerca da durabilidade e da qualidade da felicidade. Será que é tão fugaz? Será que é possível obte-la de modo permanente e verdadeiro? Na busca pelas respostas a tais perguntas o homem recorre ao dinheiro, ao sexo, aos jogos, aos vícios, a religião.
Ao fim de tudo o homem percebe que sua felicidade é tão clandestina. Ela consiste no simples fato de desejar. Antes da realização do próprio desejo ele já está feliz, pois a graça do jogo da vida está nos meios, na busca pelo que se chama felicidade.

domingo, 13 de março de 2011

"De repente, não mais que de repente" de Juliana Couto

Para Ana Paula, minha companheira de absurdos, delírios, desilusões e confissões.

Duas meninas, a princípio tão próximas e ao mesmo tempo tão distantes, se apaixonam tanto quanto qualquer jovem. Repetidas vezes se apaixonaram e repetidas vezes acabaram destroçadas, mas o gosto pela vida e a esperança de um jovem são inabaláveis.
O tempo passa. E como passa.
Duas pessoas se conhecem, em meio a uma multidão desconhecida, e se reconhecem. Duas mulheres, duas almas, dois seres perdidos, dois corações partidos [quem sabe] para sempre.
Essas duas mulheres, Paula e Julia, encontram uma na outra um porto seguro, sempre há um porto. Enquanto Julia desistia de tentar ser feliz, Paula insistia na vã crença na felicidade, ainda que efêmera, entregando-se a qualquer um que lhe oferecesse carinho, atenção e uma boa aventura.
Uma era o extremo da outra: Paula, excessiva, quente, calorosa, carente; Julia, vazia, fria e auto-suficiente – sobre este último, pelo menos era o que ela achava, ou queria se fazer acreditar, mas isso ela jamais admitiria.
Paula, a cada homem com quem se encontrava, depositava naquele momento todas as fichas de felicidade que havia conseguido entre sonhos e conquistas e nada mais. Por vezes o investimento dava lucro durante alguns dias, ou meses. Afinal, pensava ela, para quê amar para sempre se podia amar eterna e intensamente só por aquele instante?
Julia, por sua vez, repelia cada homem que tentava se aproximar dela. “Nem vou lhe beijar, gastando assim o meu batom”, dizia toda vez que um homem tentava tirar-lhe de sua solidão auto-infligida. Medo de se machucar? Não, já havia sido machucada tanto quanto podia aguentar. Era mais uma tentativa desesperada de não se apegar; aliás, tentativa, não, ela já não se apegava mais. Depois de certo indivíduo num passado não tão longínquo quanto ela gostaria, amar havia se tornado um verbo inconjugável, e amor, um substantivo mais que abstrato.
Apesar de tudo e todos, as duas se divertiam. Saíam, riam, bebiam, comiam, avaliavam e confabulavam. A vida havia perdido o gosto que teve outrora, mas não deixava de ter seu brilho. Mais que mulheres de Chico, eram amantes de Caio Fernando Abreu, Vinicius, Drummond e Freud. Partilhavam da amargura de Florbela Espanca, da acidez triste e imediatista de Clarice e compactuavam com as ideologias de abandono e entrega de Cecília Meireles.
“Talvez eu só precise de férias, um porre e um novo amor”, pensava Julia. Ora, férias ela acabara de ter – e haviam sido maravilhosas. Um porre seria essencial. Só assim ela conseguiria chorar tudo aquilo que, sóbria, sequer sonhava em chorar; havia desaprendido, entre tantas outras coisas, a chorar. Esse porre deveria ser solitário, no escuro, no silêncio – apenas ela e seus próprios demônios. E o novo amor? Ah, o novo amor...
Paula encontrava um novo amor todo dia, sem nunca deixar de amar aquele, um dia, partiu seu coração de todas as formas que se pode imaginar e, no entanto, foi o único que pôde salvá-la de si mesma inúmeras vezes.
Sobretudo, precisavam de um porre conjunto, em um lugar qualquer, em lugar algum, para que encontrassem o tal novo amor. Aquele amor que não dura mais que uma noite e que, depois de várias garrafas e declarações clichês de amor eterno, tinha como única consequência a ressaca.
“Amores serão sempre amáveis” era o que pensava Paula. Depois de não ter mais lágrimas para chorar, restavam interrogações. E, mais que isso, restava uma vida toda pela frente.
E, se um dia houvesse alguma chance de fazerem as pazes com a felicidade, jurariam emoldurá-la e guardá-la num pano de guardar confetes. No mais, estavam indo embora.


Homenagem da minha vaca mais querida.

Resenha de A dama das Camélias

A dama das camélias é uma obra de Alexandre Dumas (filho) datada de 1848 (nesse ano estão emergindo revoluções burguesas por todo mundo, até aqui no Brasil. Esta obra serviu de inspiração para José de Alencar escrever sua obra Lucíola, e há até uma referencia direta a A dama das Camélias.
A dama das camélias é um romance situado na Paris do século XIX, retratando a história de amor entre Armand Duval e sua amada Marguerit Gautier, uma cortesã.
A obra é narrada como se fosse uma leitura dos diários que Armand escreveu durante sua estada com Marguerite.
A vida de devassidão e glamou das cortesãs e dos aristocratas parisienses do século XIX são retradas, bem como há uma descrição dos costumes da época. O ciúme também é marcante nesta obra, principalmente o de Armand ao presenciar os encontros de Marguerite com seus clientes. Por vezes ele pede a ela que largue a atividade de cortesã, mas ai entre outro tema marcante, o do dinheiro. Marguerite estava na "vida" por falta de recursos, mas na "vida" enriqueceu e apresentava muitas vezes um padrão de vida acima de suas posses e que Armand não poderia manter.
Há belas partes em que Marguerite apresenta-se muito além da superficialidade da cortesã, refletindo sobre a alma e o corpo. Há de se destacar também o preconceito sofrido pelas cortesãs e pelos rapazes que as tomavam como companheiras, como no caso de Armand.
O amor de Armand e Marguerite é findado devido a doença de Marguerite que a persegue durante toda a obra, fato que vai minando as forças de Armand.
Um clássico da literatura repleto de criticas e reflexões acerca da sociedade da época, no qual transbordavam preconceitos e exploração de diversos direitos .

quinta-feira, 10 de março de 2011

Resenha de Quando Nietzsche chorou

Quando Nietzsche chorou é mais uma obra do escritor Irvin D. Yalom que data de 1992, mas a versão em portugues é de 2005. É anterior a A cura de Schopenhauer, e inaugurou o psicoterapeuta e professor Irvin na ficção que mescla psicologia e filosofia. Também segue o genero de A cura de Shopenhauer quanto a presença de temas recorrentes na psicoterapia.
A história acontece na Viena do século XIX, no qual o médico Josef Breuer vive entre dilemas e angustias oriundas da opressiva rotina familiar, de trabalho, além de tentar superar a compulsão que sente por sua antiga paciente Bertha.
Em meio a estes dilemas de Josef, aparece a estonteante Lou Salomé, que recorre desespera a Josef, a fim de socorrer seu velho amigo, um grande filósofo, de uma antiga e pertinente doença, mas o paciente não deveria saber deste pedido. E advinha quem era o grande filosofo: Nietzsche!
Josef aceita o pedido de Salomé e passa a se encontrar com Nietzsche, e o tratamento deste doente intinerante e supostamente incurável vai acontecer a base de conversa e de limpeza de chaminé, observadas atentamente pelo fiel escudeiro de Josef, jovem médico Sigmund Freud.
A troca entre médico e paciente é tão grande, no qual Josef acaba se curando de sua compulsão por Bertha, e Nietzsche da sua por seu fracassado amor Lou Salomé.
Esta obra é de tamanha ousadia, uma vez que injeta em um enredo tão intimista e reflexivo personagens famosos e verídicos como Freud e Nietzsche. Há também um belo passeio pelas principais vertentes do pensamento de Nietzsche, sua crítica sisuda ao cristianismo e a moral de escravos cristã; o eterno retorno e a transmutação de todos os valores na busca pelo superhomem. E obviamente a história não é completamente verídica.

Neste silencio

Neste silêncio me sufoco,
Os anseios e angustias
Pressionam mais que meu peito
Na busca pela libertação.

É vã a tentativa de
Libertar mediante a conversação.
Ouvidos dispostos estarão realmente dispostos?
Será que é preciso,
E ainda mais,
Será que desejo ouvir as opiniões de outrem
Acerca de assuntos tão íntimos?

Jamais alguém adentrará de fato
Ao profundis de meu ser.
É louvável a imensa dissimulação
Que me abate gerando a necessidade involuntária
De ocultar o que há de mais sombrio,
Numa superexposição do que há de mais belo.

Serei, portanto, um monstro às avessas?

Não

Não... não vou falar.
Não tenho mais a dizer,
Apenas palavras vazias,
Inúteis sem jamais serem fúteis.

Quanto tempo eu perdi,
Tantas lagrimas chorei,
Enquanto desejava apenas
Teu abraço, teu corpo, teu calor.

Mas agora já é tarde,
Não somos mais as crianças
Que outrora se descobriram;
Não sou mais aquela menininha
Que suas palavras ludibriavam.

O que me faz sentir pior
É a falta disso tudo.
A falta do abrigo que eu imaginei
Que me protegeria,
Do homem que eu havia escolhido para ser o meu,
Para amar e fazer feliz.

Não... não quero lembrar disso.
Eu sei que são coisas do passado,
Já até parece tão longínquo.

É...eu devo esquecer.
Oh! Como dói!
É até fácil entender,
Começa a ser complicado ao tentar aceitar,
Mas esquecer....

Não... não vou mais esperar.

Esquecimento

Eu acreditava que existia o para sempre,
Mas aos poucos fui percebendo
Que apenas algumas coisas são para sempre...

Acreditava que família, amor, esquecimento
Fossem infinitos, imortais.

Mas família é composta de indivíduos
Complexos, distintos e mortais.
Divergências e falecimentos
Fadam a limitação de um para sempre que não existe.

O amor...ainda não adquiri provas suficientes,
Para afirmar que não é para sempre,
Mas acredito que quando morremos,
Isso se a morte for um final e não um portal,
Todo o amor que sentimos por tudo e todos
Está fadado ao desaparecimento.

O esquecimento era o único componente deste triunvirato
Que parecia ser para sempre,
Mas hoje tenho minhas dúvidas...

Jurava que o esquecimento não possuía
Uma espécie de prazo de validade,
Que fosse eterno.

Uma completa escuridão
No qual as lembranças se perderam.
No entanto, vejo que nesta escuridão há uma luz,
Uma porta que leva a um lugar no qual
Estão as lembranças esquecidas que estão sendo lembradas.

Seremos, nós, os mesmos?

Seremos, pois, nós os mesmos?
É possível que após tantos ventos,
Tantos tormentos,
Ainda sejamos dois velhos e fracos seres,
Os quais o amor abandonou ao próprio desencanto?

Creio que somos, apenas,
Aqueles que não queríamos que fôssemos.
Somos migalhas de um passado,
Que passou, como de relance,
Por nossos olhos como estáticos espectadores.

Questiona-me, portanto,
Se não vivemos e fomos felizes.
É impossível negar a felicidade que partilhamos;
A beleza única de teus olhos, meus olhos, nossos sorrisos,
Mas o que dizer mais?

Dizer que se findou?
Que partiu como a lua amante,
Que ao amanhecer abandona e
Deixa vazio o leito antes partilhado?

Seria tão mais belo e poético,
Se dissesse que tudo isso não passou de um devaneio;
Que o fim não se abateu e,
Que hoje seríamos dois velhos e amantes.

Pena, que por mais que pareça,
A realidade não é tão bela e poética
Quanto os romances.

Pena, que deveras,
Houve um fim.
Fim este não quisto,
Mas acordado pelo destino,
Que maquina caminhos
Pelos quais é necessário passar,
Desviando do que outrora era comum objetivo.

Digo-lhe, pois, que não somos os mesmos.
Somos velhos, cansados pelas armações da vida;
Descrentes em meio a esperança,
Mas felizes em nossas ocultas infelicidades.

Resenha de A Cura de Schopenhauer

A cura de Schopenhauer é um livro do escritor Irvim D. Yalom.
É uma obra que se passa no século XXI, no qual um psiquiatra em fim de carreira em função de um melanoma e seu grupo de terapia discutem questões do dia a dia como alcoolismo, compulsão sexual, baixa estimas, dentre outros temas que permeiam sessões de terapia. Contudo, seria apenas mais um livro de autoajuda se não contasse com um passeio pela vida e a obra de Arthur Schopenhauer.
Arthur Schopenhauer é um filósofo do século XXI de instrução nilista e pessimista, com facetas descaradas de arrogancia e prepotencia, que, obviamente, devem ser suprimidas em função de sua genialidade. Um ponto interessante de sua filosofia, que é muito retratada em A cura de Schopenhauer, é a percepção do desejo como algo doentio que encarcera os indivíduos em um ciclo vicioso de desejar-buscar a satisfação do desejo-satisfazer o desejo-desejar novamente.
A cura de Schpenhauer traz este ciclo vicioso na figura do futuro orientador filosófico Phillip, que durante anos buscou terapia, a fim de curar-se de sua compulsão sexual que o impedia de se dedicar integralmente a filosofia, no qual necessitava, continuamente, de satisfação sexual, sem qualquer vinculo afetivo. Schopenhauer entra na vida de Phillip ajudando-o a superar tal compulsão. Phillip passa a observar ao pé da letra os ensinamentos de Schopenhauer, tornando-se frio e distante.
Todavia, filosofia não enche barriga, e Phillip decide fazer orientação filósofica e para tanto necessita da orientação de um terapeuta profissonal. Neste momento seu antigo terapeuta Julius(o psiquiatra acima citado)aparece em sua vida, juntamente com seu grupo de terapia.
Pode-se afirmar que houve nesta história uma dupla cura de Schopenhauer. É evidente que o filósofo contribuiu para a superação da compulsão sexual de Phillip, no entanto, contribuiu também para torná-lo uma pessoa distante das relações sociais, interpessoais. E é neste quesito que Julius e seu grupo de terapia promovem a cura aos danos que a filosofia pessimista de Schopenhauer causou em Phillip.
É um livro espetacular, não apresenta a superficialidade dos best sellers da atualidade. Aborda temas que permeiam o cotidiano e perturbam a mente humana, além de dar uma excelente prévia da filosofia do genio que é Arthur Schopenhauer.