Por Clarice Lispector

Gosto dos venenos mais lentos!
Das bebidas mais fortes!
Das drogas mais poderosas!
Das idéias mais insanas
Dos pensamentos mais complexos
Dos sentimentos mais fortes.
Dos cafés mais amargos!
Tenho um apetite voraz.
E os delírios mais loucos.
Você pode até me empurrar
de um penhasco que eu vou dizer:
E daí?
Eu adoro voar!"

sábado, 5 de junho de 2010

E VOCÊ NUNCA IRÁ PERDE-LA

Você pensa que a possui,
Pensa que tem domínio sobre ela,
E que ela estará a seus pés.

Ela nunca fez ou disse algo
Que lhe contrariasse,
Nada que quebrasse suas convicções,
Mas em seu oculto silêncio ela as quebrava.

Você pode não saber o que ela representa,
Mas ela certamente o sabe.
Toda sua confusão não tem sentido,
Já que ela é isso e tão mais que isso e,
Infelizmente você não percebe.

Ela sempre esteve a espreita.
Ela lhe velou o sono,
Acarinhou-lhe os cabelos sem a suavidade materna,
Mas com a voracidade amante.

Ela nunca o deixará,
Mas sabe que você o fará.
Ela não se preocupa em ficar só,
Pois nunca estará sem ninguém.

Você pode a outras desejar,
Mas ela nunca desejará outro.
Você se apegava a ela
Bem como a ti ela o fazia,
E não é fácil romper o que os une.


Ela lhe deu desde o princípio todos os sinais,
Pode ter errado em alguns,
Os quais foram os únicos que você viu.

Agora você sabe o que ela sempre soube.
Portanto, faça o que é certo.
Não se engane ao pensar
Que virando-lhe as costas vai matá-la;
Ela é amiga da morte e não vai sucumbir.

NÃO HÁ COMO ENTENDER

É mais que a lástima
Que ao seio lhe palpita,
Pelo bem querer inconformado
Em ser obrigado a mal querer.

É o anseio que morre ao primeiro suspiro,
Renascendo e morrendo
Em ciclo constante,
Que converge nas dolorosas ilusões.

Quando vestidas dos suspiros
E das promessas de amor eterno,
Tornam-se ternas até as mais doentias ilusões.

Quando amigas do desencanto,
Há apenas o caminho único,
Reto e irremediável das lágrimas.

Que não seja compreendido
Como o lamento desesperado
Pela perda de um alguém para toda vida,
E sim como uma canção saudosa e lacrimal
À momentos inestimáveis que jamais se repetirão.

CONFINS DENOMINADOS AMOR

Ela não é mulher
De meias palavras.
Não é daquelas que dão voltas
Para apenas chegar ao mesmo lugar.

Ela desde sempre foi a mais direta;
Indecisa em suas mil indecisões,
Perdida nas suas confusões,
Sem jamais deixar de saber o que quer.
(mas é possível que também não o saiba)

Sempre a meiguice e a ternura
Estampou-lhe a face,
Reproduzindo em seu sorriso
A energia apaixonante que a move.

De seus olhos irradia a luz,
Que a todos contagia,
Sem como e porquê.
Ela reluz por si só, e não há explicações.

Ele, também, nunca foi
O homem de deixar a vida
Dar-lhe adeus da janela do trem do destino,
Enquanto se encontrava prostrado em sua estação.

Mas era, por sua vez,
O rei das evasivas;
Aparentemente indeciso,
Enquanto suas decisões maquinalmente eram edificadas.

Senhor das máscaras,
Fantasias e personagens inúteis
Aos olhos de quem lhe percebe a essência;
Refúgio contra a exposição do coração.

Ora doce, ora completa amarguez ;
Com a espada que promovia prazer,
Dilacerava o coração,
Sem perceber sua própria laceração.

E as intempéries do destino,
Abraça e carrega vidas
Para confins desconhecidos,
Onde elas se perdem, riem e choram.
Tais confins figuram algo denominado amor.