Por Clarice Lispector

Gosto dos venenos mais lentos!
Das bebidas mais fortes!
Das drogas mais poderosas!
Das idéias mais insanas
Dos pensamentos mais complexos
Dos sentimentos mais fortes.
Dos cafés mais amargos!
Tenho um apetite voraz.
E os delírios mais loucos.
Você pode até me empurrar
de um penhasco que eu vou dizer:
E daí?
Eu adoro voar!"

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

ATÉ AQUI LEVOU?

Por mais que se tente,
Não sei o que estou fazendo aqui,
Não consigo visualizar as causas disto,
Nem reconhecer os enlaces do destino
Que resultaram nisto.

Parece que tudo se perdeu;
Tudo que possuía algum valor
Apresenta-se como inútil e falso.

É como se estivesse
Mergulhado em um furacão,
Na turbulência de um turbilhão
De expectativas e idéias inovadoras
Que emergem como filhotes de coelhos.

É pena que tão rápido
Tornem-se vãs e descartáveis;
Desprezadas ao acabarem de nascer,
Sem a mais tênue possibilidade
De fazerem-se vingar.

De explosões e supernovas
Configuravam os dias;
Constante ciclo de destruição e reconstrução,
Onde a cada dia era necessário
Construir esse dia e o que ontem se destruiu.

Sei que peguei o caminho errado;
Entrei diversas vezes na contramão da vida,
Colidi com braços que me ninaram,
Acalentaram-me;
Foram meu alento e minha desgraça.

Se um dia andei depressa,
Foi por não haver o que interessasse,
Mas hoje a solidão
Faze-me andar com a cautela
Dos que andam só.

Por mais que se tente,
Nada explica o aqui e o agora:
Um eu sem um você
Que bate na porta sem ser atendido.

(NÃO) ERA MAIS

Não era mais
Como outrora foi;
Modificaram-se os padrões,
Depuseram os paradoxos.

Nada mais era o mesmo;
Tudo estava esparso e diverso.
Não era mais o habitual,
Repentinamente tudo era novo.

Não era mais
A eterna candidez
Típica da meninice;
Era algo mais voraz.

Não havia a inútil
Necessidade do calor,
Do aconchego do corpo
De algum afeto.

Era, portanto, a solidão
Na sua expressão mais límpida,
E livre dos eufemismos poéticos.
Havia a companhia do nada,
As vozes do silencio.

Não possuía as lágrimas,
[Que um dia foram companheiras,
Nem para nascer em seu âmago
A costumeira revolta.

Era mais que um coração vazio,
Pelo contrario, era um coração tão cheio:
Cheio de uma alegria incondicional,
De um amor inesgotável,
De uma carência insaciável.
Era, na verdade, um coração solitário.

Não era mais
As dores de amor que ardiam do peito.
O amor havia decidido tirar umas férias;
Conhecer outros lugares,
Lares e corpos.

Era um vazio insubstancial,
Em meio a tantos atrativos,
Tantas multidões.
Cheio demais para estar vazio.


Era mais que
As dores da meninice;
As alegres dores da inocência,
Acompanhadas das mais ternas duvidas.

Eram as dores da adultez;
Dores da mulher;
Nascentes e fulgurantes.
Novidades em um corpo
E em uma mente
Emersos nas duvidas
Do “como agir”,
Uma vez que agora era por si
E não havia mais ninguém.

Não era mais que uma menina,
Mas, deveras, era mais que uma bela mulher.