Por Clarice Lispector

Gosto dos venenos mais lentos!
Das bebidas mais fortes!
Das drogas mais poderosas!
Das idéias mais insanas
Dos pensamentos mais complexos
Dos sentimentos mais fortes.
Dos cafés mais amargos!
Tenho um apetite voraz.
E os delírios mais loucos.
Você pode até me empurrar
de um penhasco que eu vou dizer:
E daí?
Eu adoro voar!"

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

O VOO DA FRAGATA

Voa velha fragata,
Vá ser livre!
Libere-te de tuas amarras,
Alce teu vôo puro.

Voa velha fragata,
Para além mar!
Longe de teu cativeiro,
Onde não sejas subjugada
Por teus algozes.

Voa velha fragata,
Levanta-te do leito de angustia!
Mergulhe no mar de paz,
Esqueças de toda a tristeza.

Voa velha fragata,
Desprenda de teus olhos
As mais salgadas das lagrimas,
Fazendo chover no sertão.

Voa velha fragata,
Não tenhas medo de chorar!
Inundes as planícies Amazônicas.

Voa velha fragata,
Mas não esqueças
De levar contigo
Meu amargo coração.

AS METADES

Uma metade
Da minha família perdeu-se.
Foi a metade mais pura,
E a mais bonita.

A realidade
É o mais longo sonho,
Que eu poderia estar sonhando.

Se consolidou como sendo
Muito mais que mero sonho.
Um cruel e distorcido
Pesadelo interminável,
Que paulatinamente dilacera
As minúcias de minha razão.

Caso o sonho,deveras,
Tenha sucedido,
Certamente foi no passado.
O qual revestiu-se
De um esplendor irreal.

-Oh morcego da discórdia!
Por que bateste tuas asas e,
Levaste para longe de meu lado
A parte mais bela e inocente de minha família?

Findou-se o meu idealizado sonho,
Escancarando-se as portas do reino do pesadelo.
Todos os seus demônios saíram,
Pondo um ponto final
Na perfeição do meu real.

A metade mais linda
Da minha família partiu,
Cedo demais para
Assimilar que o sonho acabou.

QUE VOLTES DEPRESSA

Meu lorde inglês
Onde estavas?
Por que repentinamente
Emergiste do branco.

Ulisses chegou
A nosso recanto sem ti.
Imediatamente inquietei-me :
-O que sucedeu com meu lorde?

Num ímpeto de desespero
Rompo noite adentro,
A esmiuçar a floresta densa.

Os urubus,as corujas
Cantam-me tua canção de partida.
Com os cabelos em desalinho
Mergulho em um pérfido enlouquecimento.

Desato-me a chorar,
Inconsolável perante tua partida.
Desiludida com a noite ,
Cuja escuridão separou-me de ti.

Não há mais lagrimas...
Não há mais cabelos...
O tempo foi tão tirano,
Condenando-me a penitencia eterna.

Eis que ,numa tempestuosa noite,
Tu reapareceste das sombras
Embainhando tua espada,
Arrebatando-me num abraço sufocante.

LUZES DA HISTÓRIA

Luzes da escuridão...
Contraditório ou não,
Busca-se o claro no escuro,
O cheio no vazio,
O principio no fim.

É a obscura angustia,
Que assim como a maré no rochedo,
Vai batendo,ferindo,desfalecendo
Um coração amedrontado
Que receia a consolidação da intuição.

Breve são o tempo e a convivência
Quando se abate o perigo,
Quando o inimigo
Tudo está mais frio,
Então, tudo é muito pouco...

Agora tudo o que foi vivido
Está no passado.
Momentos são memórias...
Clama-se para que o tempo retorne,
Para não chorar a saudade,
Para não defrontar com a realidade.

Tão mais vazio e triste.
É um dia de inverno
Em que os ventos balançam as folhas e,
Vem lhe buscar a porta.