Por Clarice Lispector

Gosto dos venenos mais lentos!
Das bebidas mais fortes!
Das drogas mais poderosas!
Das idéias mais insanas
Dos pensamentos mais complexos
Dos sentimentos mais fortes.
Dos cafés mais amargos!
Tenho um apetite voraz.
E os delírios mais loucos.
Você pode até me empurrar
de um penhasco que eu vou dizer:
E daí?
Eu adoro voar!"

domingo, 11 de julho de 2010

SACRIFÍCIO

Afia tua faca;
Crave-a em meu peito,
E não tenhas dó!
Não reserves nem um fiapo, ao menos, de piedade.

Vá dilacere-me,
Tens a oportunidade em tuas mãos,
Sabes o que deves fazer.
Não hesites, vá até o fim.

É inútil dissimular.
Sempre fizestes tantas atrocidades;
Sempre fostes um animal, um monstro.
Então faças o que te peço.

Cinja-me com tua chibata,
Coberta do ostracismo dos tempos
Em que foste escravo do desprezível.
Seja desprezível.

Lave-me com teu sangue,
Para que meu sacrifício seja viável.
Um sacrifício pérfido e doce,
Com o pleno consentimento do sacrificado.

Abuses de meu complexo de Estocolmo;
Não receies que o sacrificado
Irá vingar-se de seu carrasco.
O sacrificado nutre um amor incondicional por ti.

Leve-me ao alto do monte,
Em meio ao recanto no qual jazem os mortos,
Onde a vida brinda a seu gran final,
Possua-me com toda tua força;
Violente-me repleto da mais sanguinolenta
Perfídia e virilidade do desejo.

Entregues-te ao me possuir.
Invada todos os meus poros,
Fundes teu corpo ao meu,
Para então rasgar minh’alma
E findar o que há muito
Jaz findo.

E a noite tu me tiraste o sono

Sinto-me triste e abatida;
As memórias insistem
Em ressurgir em minha mente
Tirando-me o sono.

É inútil, pois, tentar
Buscar refúgio no sono.
É como o morcego que persegue
E tira a paz.

Tentei, em vão chorar,
Para ficar, talvez, exaurida,
Ainda mais fraca do que já estou,
E despencar... e esquecer.
Ilusão... as lágrimas não ousam dar o ar da graça.

O desespero aperta o peito;
A angústia assola e,
Infelizmente não há nada a se fazer.

A presença da dor,
Faze-me perceber
Que não és o maior dos problemas.
Estás vivendo tua vida,
Executando sua felicidade.
Eu cria que fosse tal coisa
A causa em si do meu sofrimento.

É a perspectiva
De possuir a felicidade usurpada e,
Não poder fazer nada para impedir;
É uma infelicidade patogênica,
Que me arrebata mesmo sem querer.

Clamo a Deus,
Que tudo isto se finde.
Não peço mais que voltes para mim,
Mas que me liberte
E recobre a felicidade e
A capacidade de amar outra vez.