Por Clarice Lispector

Gosto dos venenos mais lentos!
Das bebidas mais fortes!
Das drogas mais poderosas!
Das idéias mais insanas
Dos pensamentos mais complexos
Dos sentimentos mais fortes.
Dos cafés mais amargos!
Tenho um apetite voraz.
E os delírios mais loucos.
Você pode até me empurrar
de um penhasco que eu vou dizer:
E daí?
Eu adoro voar!"

quinta-feira, 10 de março de 2011

Resenha de Quando Nietzsche chorou

Quando Nietzsche chorou é mais uma obra do escritor Irvin D. Yalom que data de 1992, mas a versão em portugues é de 2005. É anterior a A cura de Schopenhauer, e inaugurou o psicoterapeuta e professor Irvin na ficção que mescla psicologia e filosofia. Também segue o genero de A cura de Shopenhauer quanto a presença de temas recorrentes na psicoterapia.
A história acontece na Viena do século XIX, no qual o médico Josef Breuer vive entre dilemas e angustias oriundas da opressiva rotina familiar, de trabalho, além de tentar superar a compulsão que sente por sua antiga paciente Bertha.
Em meio a estes dilemas de Josef, aparece a estonteante Lou Salomé, que recorre desespera a Josef, a fim de socorrer seu velho amigo, um grande filósofo, de uma antiga e pertinente doença, mas o paciente não deveria saber deste pedido. E advinha quem era o grande filosofo: Nietzsche!
Josef aceita o pedido de Salomé e passa a se encontrar com Nietzsche, e o tratamento deste doente intinerante e supostamente incurável vai acontecer a base de conversa e de limpeza de chaminé, observadas atentamente pelo fiel escudeiro de Josef, jovem médico Sigmund Freud.
A troca entre médico e paciente é tão grande, no qual Josef acaba se curando de sua compulsão por Bertha, e Nietzsche da sua por seu fracassado amor Lou Salomé.
Esta obra é de tamanha ousadia, uma vez que injeta em um enredo tão intimista e reflexivo personagens famosos e verídicos como Freud e Nietzsche. Há também um belo passeio pelas principais vertentes do pensamento de Nietzsche, sua crítica sisuda ao cristianismo e a moral de escravos cristã; o eterno retorno e a transmutação de todos os valores na busca pelo superhomem. E obviamente a história não é completamente verídica.

Neste silencio

Neste silêncio me sufoco,
Os anseios e angustias
Pressionam mais que meu peito
Na busca pela libertação.

É vã a tentativa de
Libertar mediante a conversação.
Ouvidos dispostos estarão realmente dispostos?
Será que é preciso,
E ainda mais,
Será que desejo ouvir as opiniões de outrem
Acerca de assuntos tão íntimos?

Jamais alguém adentrará de fato
Ao profundis de meu ser.
É louvável a imensa dissimulação
Que me abate gerando a necessidade involuntária
De ocultar o que há de mais sombrio,
Numa superexposição do que há de mais belo.

Serei, portanto, um monstro às avessas?

Não

Não... não vou falar.
Não tenho mais a dizer,
Apenas palavras vazias,
Inúteis sem jamais serem fúteis.

Quanto tempo eu perdi,
Tantas lagrimas chorei,
Enquanto desejava apenas
Teu abraço, teu corpo, teu calor.

Mas agora já é tarde,
Não somos mais as crianças
Que outrora se descobriram;
Não sou mais aquela menininha
Que suas palavras ludibriavam.

O que me faz sentir pior
É a falta disso tudo.
A falta do abrigo que eu imaginei
Que me protegeria,
Do homem que eu havia escolhido para ser o meu,
Para amar e fazer feliz.

Não... não quero lembrar disso.
Eu sei que são coisas do passado,
Já até parece tão longínquo.

É...eu devo esquecer.
Oh! Como dói!
É até fácil entender,
Começa a ser complicado ao tentar aceitar,
Mas esquecer....

Não... não vou mais esperar.

Esquecimento

Eu acreditava que existia o para sempre,
Mas aos poucos fui percebendo
Que apenas algumas coisas são para sempre...

Acreditava que família, amor, esquecimento
Fossem infinitos, imortais.

Mas família é composta de indivíduos
Complexos, distintos e mortais.
Divergências e falecimentos
Fadam a limitação de um para sempre que não existe.

O amor...ainda não adquiri provas suficientes,
Para afirmar que não é para sempre,
Mas acredito que quando morremos,
Isso se a morte for um final e não um portal,
Todo o amor que sentimos por tudo e todos
Está fadado ao desaparecimento.

O esquecimento era o único componente deste triunvirato
Que parecia ser para sempre,
Mas hoje tenho minhas dúvidas...

Jurava que o esquecimento não possuía
Uma espécie de prazo de validade,
Que fosse eterno.

Uma completa escuridão
No qual as lembranças se perderam.
No entanto, vejo que nesta escuridão há uma luz,
Uma porta que leva a um lugar no qual
Estão as lembranças esquecidas que estão sendo lembradas.

Seremos, nós, os mesmos?

Seremos, pois, nós os mesmos?
É possível que após tantos ventos,
Tantos tormentos,
Ainda sejamos dois velhos e fracos seres,
Os quais o amor abandonou ao próprio desencanto?

Creio que somos, apenas,
Aqueles que não queríamos que fôssemos.
Somos migalhas de um passado,
Que passou, como de relance,
Por nossos olhos como estáticos espectadores.

Questiona-me, portanto,
Se não vivemos e fomos felizes.
É impossível negar a felicidade que partilhamos;
A beleza única de teus olhos, meus olhos, nossos sorrisos,
Mas o que dizer mais?

Dizer que se findou?
Que partiu como a lua amante,
Que ao amanhecer abandona e
Deixa vazio o leito antes partilhado?

Seria tão mais belo e poético,
Se dissesse que tudo isso não passou de um devaneio;
Que o fim não se abateu e,
Que hoje seríamos dois velhos e amantes.

Pena, que por mais que pareça,
A realidade não é tão bela e poética
Quanto os romances.

Pena, que deveras,
Houve um fim.
Fim este não quisto,
Mas acordado pelo destino,
Que maquina caminhos
Pelos quais é necessário passar,
Desviando do que outrora era comum objetivo.

Digo-lhe, pois, que não somos os mesmos.
Somos velhos, cansados pelas armações da vida;
Descrentes em meio a esperança,
Mas felizes em nossas ocultas infelicidades.

Resenha de A Cura de Schopenhauer

A cura de Schopenhauer é um livro do escritor Irvim D. Yalom.
É uma obra que se passa no século XXI, no qual um psiquiatra em fim de carreira em função de um melanoma e seu grupo de terapia discutem questões do dia a dia como alcoolismo, compulsão sexual, baixa estimas, dentre outros temas que permeiam sessões de terapia. Contudo, seria apenas mais um livro de autoajuda se não contasse com um passeio pela vida e a obra de Arthur Schopenhauer.
Arthur Schopenhauer é um filósofo do século XXI de instrução nilista e pessimista, com facetas descaradas de arrogancia e prepotencia, que, obviamente, devem ser suprimidas em função de sua genialidade. Um ponto interessante de sua filosofia, que é muito retratada em A cura de Schopenhauer, é a percepção do desejo como algo doentio que encarcera os indivíduos em um ciclo vicioso de desejar-buscar a satisfação do desejo-satisfazer o desejo-desejar novamente.
A cura de Schpenhauer traz este ciclo vicioso na figura do futuro orientador filosófico Phillip, que durante anos buscou terapia, a fim de curar-se de sua compulsão sexual que o impedia de se dedicar integralmente a filosofia, no qual necessitava, continuamente, de satisfação sexual, sem qualquer vinculo afetivo. Schopenhauer entra na vida de Phillip ajudando-o a superar tal compulsão. Phillip passa a observar ao pé da letra os ensinamentos de Schopenhauer, tornando-se frio e distante.
Todavia, filosofia não enche barriga, e Phillip decide fazer orientação filósofica e para tanto necessita da orientação de um terapeuta profissonal. Neste momento seu antigo terapeuta Julius(o psiquiatra acima citado)aparece em sua vida, juntamente com seu grupo de terapia.
Pode-se afirmar que houve nesta história uma dupla cura de Schopenhauer. É evidente que o filósofo contribuiu para a superação da compulsão sexual de Phillip, no entanto, contribuiu também para torná-lo uma pessoa distante das relações sociais, interpessoais. E é neste quesito que Julius e seu grupo de terapia promovem a cura aos danos que a filosofia pessimista de Schopenhauer causou em Phillip.
É um livro espetacular, não apresenta a superficialidade dos best sellers da atualidade. Aborda temas que permeiam o cotidiano e perturbam a mente humana, além de dar uma excelente prévia da filosofia do genio que é Arthur Schopenhauer.