Ventos secos do inverno,
Chuvas frias,
Gotas molhando a janela do quarto.
O som do rádio é alto,
Ela emite a voz esganiçada
Do cantor em “November Rain” e,
Ela alheia tudo
Com o “o Nome da Rosa” nas mãos.
Faz horas que ouve repetidamente
“November Rain”,
Já chorou tanto
Que não lhe restam mais lágrimas.
Desistiu de ler,
Quer apenas que essa dor cesse,
Mas não,ela não se vai.
Fica atordoando-a.
Vai levá-la a loucura.
Muitas vezes já gritou:
-a dor é excitante!
Compulsão maníaco-masoquista...
Agora nada é tão mais prazeroso.
A dor é venerável desde que
Não haja lágrimas.
Ela deseja partir,
Não possui forças.
Deseja gritar
Não possui voz.
Muda a música no rádio,
Agora é “A Tout Le Monde”.
Sempre repudiou Metal,
Agora,no desespero,é bem acolhedor.
A voz que canta o suicídio
Ecoa em sua mente.
É agradável.
As lágrimas voltaram...
Pega caneta e papel,escreve:
-“A todo mundo,
A todos os meus amigos,
Eu vos amo,
Mas tenho que partir.”
No rádio a música mudou
Para “Last Kiss”.
Ele se foi...
Não como na canção,
Mas tiveram um último beijo,
Uma última noite.
Deveras,jamais o teria novamente.
Vozes sussurram em seus ouvidos:
-vá,vá...a luz te espera!
Tem tanto medo.
Deseja findar o sofrimento,
Mas não quer ir,
Não quer que os que ama chorem.
A casa está vazia;
Vai até o banheiro;
Liga a torneira e
Enche de água a banheira.
A campainha toca,
Vai até a porta,
É ele.
Ele sabe o que está passando,
Tem medo de perdê-la,
Tenta inutilmente detê-la.
O pequeno canivete,
Com “Clarisse” no rádio,
Faz incisões naquele corpo
Que um dia foi seu.
Ele se foi ,de fato,para longe.
Não há mãe,
Não há irmãos,
O pai superará.
Nada mais a impede.
Pega um poema
De Alvarez de Azevedo.
Suas palavras de adolescente
São semelhantes a do poeta.
-os poetas morrem jovens!
Volta ao quarto.
A voz de Eric Clapton
Sai do rádio em “Tears in Heaven”.
A mãe…no céu
Ele...seu céu de “sky” e o céu de “heaven”.
A água da banheira é fria,
Mais fria que a água da chuva.
O metal nos pulsos.
O sangue esquenta a água.
Submerge na água com sangue,
Vê o tempo passar,
O mundo girar,
O ar deixar seus pulmões.
Os fantasmas do torpor vem chamá-la,
Tudo é alucinação,
Os anjos a carregam pelas mãos e,
O véu da morte lhe abraça.